Vozes da Diáspora nos Açores
As comunidades de origem açoriana no continente norte-americano têm um
riquíssimo mancial de órgãos da comunicação social. Os jornais comunitários fazem parte das
nossas vivências desde o século XIX. As rádios desde as primerias décadas do
século XX. Os programas de televisão desde a década de 1970. Todos têm contribuido para uma melhor ligação
Açores-Diáspora. As nossas comunidades
não seriam as mesmas sem os seus órgãos da comunicação social. O seu contributo, nas eras pré-internet foram
marcantes. Hoje, apesar das tecnologias
avançadas, das redes sociais e da notícia dada a cada mínuto, a comunicação
social da diáspora continua a ser um repositório importante da nossa história
coletiva em terras do novo mundo e um elo de ligação à terra de origem ou à
terra dos nossos pais, ou avós.
Partindo desse princípio, a Direção Regional das Comunidades, do governo da
Região Autónoma dos Açores, acaba de promover um encontro com os órgãos da
comunicação da diáspora, realizado, ao longo de 5 dias, nas ilhas do Faial,
Pico e São Jorge. Cerca de 4 dúzias de
representantes de vários orgãos da comunicação social estiveram presentes na
região a fim de conhecerem-se melhor, conhecerem melhor os Açores e debaterem,
com os OCS (orgãos da comunicação social) dos Açores as realidades atuais e
alguns desafios do futuro.
Os Açores de hoje foram apresentados através de um conjunto de palestras feitas
pelos diversos diretores e secretários regionais, assim como presidentes de
institutos, seguidas de questões e comentários (mais os segundos do que os
primeiros) sobre os temas delineados. As
politics estratégicas do atual governo para o mar, o ambiente, o turismo, os
investimentos, a juventude e as comunidades fizeram parte do extenso programa. Todos estes tópicos foram apresentados
holisticamente, com uma visão gobal, alicerçada no passado mas com olhos postos
no futuro. As comunidades, o plano
geral, assim como todo o apoio e toda a amalgama de serviços prestados aos
emigrantes e imigrantes foi realçada com precisão e pertinência. Não fosse o jovem Paulo Teves, o anfitrião
deste encontro (rodeado de uma equipa extremamente profissional) um conhecedor
da nossa Diáspora e um Diretor Regional com uma visão alargada das nossas
comunidades, quer pela sua experiência como técnico na DRC desde 2003, quer
pela sua capacidade de trabalho e a sua preocupação genuina com as nossas
comunidades e a sua ligação aos Açores.
A cultura, um dos sectores mais empolgantes dos Açores, não fôssemos a
terra de Antero de Quental, Vitorino Nemésio, Natália Correia, Francisco
Lacerda, António DaCosta e tantos outros, ficou cingida a um roterio pelos
museus dos Açores. A apresentação sobre
a cultura dos Açores teve, porém, um momento alto, emotivo e de genuína açorianidade:
duas canções, que marcam a alma açoriana em todo o mundo, magistralmente
interpretadas como o artista Manuel Costa as sabe interpretar; vivendo-as e
evolvendo-nos afetivamente. A cultura
esteve ainda bem patente com a presença e a apresentação feita ao longo de dois
dias na ilha do Pico pelo Manuel Serpa, que mais do que um ícone da ilha
Montanha, é uma referência no panorama cultural e político das ilhas açorianas.
A presença do jovem Presidente do Governo da Região Autónoma dos Açores, na
sessão de abertura, o qual sintetizou a relevância dos OCS da Diáspora na
construção das nossas comunidades, foi importante para os presentes, que ao
longo do encontro salientaram, nas várias conversas públicas, e de bastidores,
o significado da presença de Vasco Cordeiro.
A mesma sessão foi marcada por uma comunicação, emotiva e bem
fundamentada, eloquentemente apresentada pelo distinto jornalista José Lopes de
Araújo. Traçou as nossas ondas
emigratórias, focou o relacionamento afetivo que se sente em todas as ilhas
para com aqueles que um dia as deixaram, e os seus rebentos, assim como através
de duas obras literárias, trasnformadas em séries televisivas por Zeca
Medeiros, O Barco e o Sonho e Gente Feliz Com Lágrimas,
magistralmente, salientou elementos fulcrais da idiossincracia açoriana e do
peso que as Américas tiveram, e ainda têm, na construção da açorianidade.
O debate sobre os desafios que enfrentam (ou enfrentarão a médio prazo) a
comunicação social da diáspora, sabiamente conduzido pelo critico literário
Vambero Freitas (não fosse ele um profundo conhecedor e colaborador da nossa
imprensa além arquipélago), e com a presença dos OCS da região, cingiu-se, por
insistência dos representantes da nossa comunicação social da diáspora, a
debater-se a língua portuguesa nas comunidades.
Alguns dirigentes dos OCS da região questionaram a abertura dos nossos
media das comunidades em relação ao bilinguismo, à utilização do inglês e à
ousadia de se explorar outros formatos e outros conceitos para estarmos mais
próximos das novas gerações de açor-descendentes. A nossa comunicação social, em algumas zonas
mais do que outras, terá mesmo que se reinventar se quiser ser relevante para
as novas gerações de açor-descendentes.
Tal como afirmei nesse debate, a Califórnia tem cerca de 385 mil pessoas
que se identificaram no recenseamento de 2010 como sendo de origem portuguesa,
mas menos de 60 mil disseram que usavam outra língua além do inglês, presume-se
o português no seu quotidiano. Daí que
há uma amalgama de açor-descendentes que não têm acesso aos OCS em língua
portuguesa. Poderá ser diferente em
outras regiões dos Estados Unidos e do Canadá, mas para aí se caminha. Aliás, no voo de Boston para as Lajes na
Terceira, a vasta maioria dos luso-descendentes presentes falava em inglês, e
das 200 e tal alminhas no voo, nem duas dúzias entrou com passaporte português.
As comunidades de origem açoriana estão a mudar e é imperatico que nós que
estamos na OCS da diáspora tenhamos a audácia de sairmos um pouco da nossa zona
de comforto e saibamos incorporar serviços informativos e formativos para as
novas gerações. Como referenciei na
sessão de encerramento deste encontro, cada comunidade é diferente, cada órgão
da comunicação social conhece o seu mercado, a sua audiência e certamente que
saberá reinventar-se para as novas comunidades que despontam um pouco por todo
o continente norte-americano. O que
servirá para a Califórnia, será diferente para a Costa Leste, e sê-lo-á
dissemelhante para o Canadá que tem a nossa emigração mais jovem. Porém, é imperativo que cada um dos OCS
reflita a sua comunidade, a sua realidade e esteja consciente que as
comunidades de hoje não serão as comunidades de amanhã. É que os Açores já compreenderam isso.
Este encontro trouxe ainda aos representantes de vários OCS o conhecimento
mútuo. Apesar da presença de alguns
veteranos, o encontro teve ainda a presença de vários elementos (diria mesmo a
maioria) que nunca tinha participado nestes eventos. Essa troca de ideias, experiências,
vivências, aspirações, sonhos, desejos e a camaradagem vivida, certamente que
enriquecerá as comunidades e fortalecerá os tão desejados e necessários
intercâmbios entre quantos trabalham nos OCS da diáspora. É que tão importante como conhecer-se os
Açores de hoje e todos os esforços que se faz para aumentar e aperfeiçoar o
turismo para o nosso arquipélago de origem, um segmento cada vez mais
importante para a melhoria económica das ilhas, é extremamente pertinente que
as comunidades se conheçam mutuamente e partilhem mais experiências e mais
recursos. Este encontro, de uma forma
menos formal, mas muito intensa, teve essa componente.
Está terminado o encontro. Cada
representante certamente que regressou à sua comunidade porque há jornais para
imprimir, programas de rádio para produzir e programas de televisão a
realizar. Acredito que cada
participante, ou a vasta maioria, já começou a refletir o encontro e a passar
os testemunhos dos novos Açores às suas respetivas comunidades. É que tal como
foi sugerido, os novos Açores, nas suas mais variadas vertentes, desde as novas
formas de se fazer e promover o turismo, vindo dos mais variados destinos, à
ainda importante visita da saudade e a da descoberta ou redescoberta das
raízes, passam por uma miríade de conjunturas e filamentos que se unem, na
cultura secular que define o povo destas ilhas e a sua ligação ao novo
mundo.
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